A Enfermagem não é ideológica

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A tradição democrática portuguesa implica a existência de partidos políticos, partidos esses condicionados, sujeitos e fundados em ideologias, sendo exclusivo destes a escolha dos candidatos a deputados e a um sem fim de poderes e influências. Esta existência de partidos pressupõe escolhas, quer dos seus potenciais votantes, quer dos seus militantes.
Porém, sendo a política passível de ser definida de muitas formas, ela ambiciona encontrar a melhor forma de gerir uma comunidade, seja uma freguesia, uma cidade, um país ou um continente. Assumindo um partido político como um meio de ação duma ideologia e uma ideologia uma cosmovisão, abordará todos os aspetos da vida em sociedade. Ora, como “cada cabeça sua sentença”, quanto mais aspetos pretender reger a política, mais potenciais discórdias serão criadas e assim cada partido será um fator de discórdia e de divisão, pois como o nome diz, os partidos “partem”, podendo criar fenómenos de clubismo ou sectarismo que poderão ser bons a “institucionalizar conflitos” mas não são bons para atingir consensos e resultados.
Assim, os partidos são ideológicos, pressupõem uma cosmovisão… mas a Enfermagem não é ideológica! A Enfermagem sendo várias coisas, não é com certeza um meio de atingir fins políticos. A Enfermagem é uma profissão, ciência e disciplina com um intuito social bem demarcado com a sua utilidade social para os cidadãos saudáveis, enfermos ou doentes. No contexto português, os enfermeiros são representados em várias dimensões da sua vida por diferentes associações, entidades e organizações, quer pessoal quer profissionalmente. Mas a única associação que representa todos os enfermeiros é a Ordem dos Enfermeiros. Uma associação pública profissional representativa, que goza de personalidade jurídica e é independente dos órgãos do Estado, sendo livre e autónoma no âmbito das suas atribuições, pode ler-se na segunda alteração ao Estatuto da Ordem dos Enfermeiros publicado em Lei nº 156/2015 de 16 de setembro.
Ora, uma organização que representa todos os enfermeiros não pode ser fragmentada em partidos, está acima destes e representa apenas a Enfermagem, quer no dever dos enfermeiros em exercerem-na adequadamente às pessoas, quer na defesa e no direito dos enfermeiros a condições dignas para a prestação dos cuidados de Enfermagem. Tais desígnios da Ordem não se compadecem com a segmentação que a influência de partidos políticos podem induzir na sua atividade e nos seus membros. A ideologia deve ser reservada à ação política e não à ação da Ordem enquanto “pessoa coletiva de direito público”. A única ideologia da Ordem deve ser a Qualidade da Enfermagem, na defesa dos interesses gerais dos destinatários e a representação e defesa dos interesses da profissão. Os partidos políticos devem zelar pelo Bem comum, esgotando-se aí a sua influência.
Como tal, devem os partidos coadjuvar a Ordem dos Enfermeiros a atingir os seus desígnios e não o contrário. Não deve a Ordem ser um meio de uma ou mais personalidades da Enfermagem, conhecidos militantes de partidos políticos para atingirem o seu fim, o poder. A vertigem que o poder pode trazer não nos pode fazer perder o foco que a independência da Ordem significa. Colocar a Ordem conotada com um partido político é encostá-la a ciclos políticos e refém dos reais interesses destes. Pode inclusive ameaçar a continuidade de uma organização com esta dimensão.
Porque o que é Bom leva tempo a construir, é muito mais fácil e rápido destruir, não o é contudo reerguer de novo. Devemos exigir uma Ordem dos Enfermeiros de todos, livre de partidos e cujo único partido é a Enfermagem.

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