PAULO ALVES, consultor de diferentes governos regionais e internacionais para a área do ambiente
A Lipor recusa-se em tratar as cinzas volantes da sua incineradora da maneira certa. A Lipor hoje inertiza as suas cinzas volantes para posteriormente as depositar numa célula do seu aterro, já ultrapassando a sua capacidade e quota máxima. Isto não é legal.
Por ter ultrapassado a quota máxima a Lipor tem de encontrar um destino alternativo no exterior. As cinzas inertizadas são consideradas na Europa fora como resíduos perigosos, mas a Lipor insiste em classificá-las como não-perigosas. Se as cinzas forem perigosas, Portugal tem destinos licenciados: os CIRVER.
No entanto, a Lipor insiste em considerar estas cinzas como não-perigosas e depositá-las num aterro de resíduos banais. Para consubstanciar esta classificação, a Lipor encomendou à Veolia um estudo sobre a perigosidade dos resíduos, na tentativa de demonstrar a não perigosidade dos mesmos, o qual não convenceu a APA. Tanto mais que se sabe que a VEOLIA, perante o mesmo tipo de resíduos, defende em França o comportamento oposto, depositando-o em aterro de resíduos industriais perigosos, o equivalente em Portugal a um CIRVER! Ou seja, a VEOLIA, maior grupo francês do ambiente, recomenda para Portugal o que não faz em França. Será que o ambiente e a saúde pública valem menos em Portugal do que em França?
A Agência Portuguesa do Ambiente é perentória: as cinzas volantes são perigosas! A LIPOR produz na sua unidade de incineração resíduos – cinzas volantes – com características de perigosidade que levaram a Agência Portuguesa do Ambiente a determinar, numa carta de julho 2016 endereçada à própria Lipor, que “uma vez que as cinzas volantes produzidas na central de valorização energética, quer no seu estado bruto quer no seu estado inertizado, são um resíduo perigoso nos termos da legislação em vigor, estas deverão ser tratadas como sendo resíduos perigosos, devendo por isso ser encaminhados para um operador de gestão de resíduos perigosos habilitado ao seu tratamento».
Assentando sua decisão nos resultados do estudo encomendado pela LIPOR ao gigante do ambiente, a francesa Veolia, a APA é perentória ao afirmar que “As cinzas no estado bruto apresentam duas características de perigosidade … De acordo com estes resultados, as cinzas brutas em questão enquadram-se na definição de resíduos perigosos, nos termos do estabelecido na alínea II) do artigo 3º do Regime Geral de Gestão de Resíduos (RGGR), definido no Decreto-Lei nº 178/2006, de 5 de setembro, com a redação conferida pelo Decreto-Lei nº 73/2011, de 17 de junho, pelo que, nos termos da LER, deverão ser classificadas com o código LER 190113* cinzas volantes contendo substâncias perigosas e as cinzas inertizadas deverão ser classificadas com o código LER 190306* – resíduos assinalados como perigosos, solidificados”.
Desde Julho, a Lipor continua a negar este facto!
A gestão das cinzas da unidade de incineração da LIPOR tem suscitado muitas dúvidas e foi lançado, pela Quercus, o alerta para a perigosidade destes resíduos. Ao longo deste ano instalou-se a controvérsia e estamos longe de se ter chegado ao final deste episódio, uma vez que, não obstante a última decisão da APA, a administração da LIPOR continua a “tratar” dentro de portas um resíduo considerado perigoso. Que razões tem a LIPOR para insistir numa solução desconsiderando a perigosidade dos resíduos? Será inesgotável a capacidade da célula do aterro da LIPOR onde estes resíduos estão a ser despositados e cujo esgotamento levou à abertura de um concurso público para o seu tratamento? Mistérios!