Síndrome Mielodisplásica – uma doença hemato-oncológica

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As Síndromes Mielodisplásicas (SMD) são doenças hemato-oncológicas que se caracterizam pela presença de uma medula óssea geralmente hipercelular, mas a medula óssea não produz células sanguíneas normais em quantidade suficiente. Como não se formam normalmente os vários elementos que constituem o sangue, quando se fazem análises, vemos que no hemograma que os valores dos glóbulos vermelhos, dos glóbulos brancos e das plaquetas podem estar diminuídos (citopenias como anemia, leucopenia e trombocitopenia, respectivamente). A incapacidade da medula óssea para produzir as células é um processo gradual. Poderá começar por atingir apenas uma série, por exemplo: inicialmente o doente pode ter apenas anemia, e posteriormente, apresentar também leucopenia e trombocitopenia.

A SMD pode ser primária (SMD de novo) ou ocorrer 1-15 anos após exposição a quimioterapia ou radioterapia (SMD relacionada com a terapêutica). Na maioria dos casos não se evidencia uma causa para o desenvolvimento da SMD.

A incidência é de 5/100000 habitantes/ano. Contudo, nas pessoas com mais de 60 anos, a incidência aumenta para 20-50 por 100000 habitantes/ano. Sendo que a maioria dos doentes tem mais de 60 anos de idade quando é efetuado o diagnóstico.

Alguns doentes podem não apresentar sintomas e a suspeição diagnóstica pode surgir após realização de análises por outro motivo. No entanto, a maioria dos doentes procura o médico por clínica relacionada com a anemia, nomeadamente, astenia, cansaço após esforço, dor no peito, palpitações, tonturas, falta de ar, palidez. Menos frequentemente, ocorrem infecções de repetição ou hemorragias. Sintomas como a febre e perda de peso são pouco habituais no início da doença.

O diagnóstico baseia-se na realização de análises de sangue: hemograma, onde se observam as citopenias; esfregaço de sangue periférico, para avaliação morfológica das células; e na observação da medula óssea. O exame da medula óssea consiste num aspirado medular (mielograma) e numa biópsia medular óssea, após anestesia local. O sangue medular é também indispensável para a realização dos estudos citogenéticos, importantes para o diagnóstico e prognóstico.

A SMD é uma doença heterogénea que inclui diversos subtipos, de gravidade variável, necessidade de terapêuticas diversas e esperanças de vida diferentes. Utiliza-se a classificação da Organização Mundial de Saúde (OMS) e os índices de prognóstico (IPSS, IPSS-R – International Prognostic Scoring Systems) para identificar grupos de risco (baixo risco e alto risco) e efectuar a decisão terapêutica mais adequada. Um doente com SMD de baixo risco pode viver muitos anos sem necessitar de terapêutica, enquanto um doente com SMD de alto risco normalmente necessita de tratamento imediato, sem o qual a sua esperança de vida pode não exceder 1-2 anos.

Não existe tratamento curativo para a SMD, com excepção do transplante alogénico de progenitores hematopoiéticos (células da medula óssea) mas que não está indicado na maioria dos doentes, devido à sua idade e problemas médicos (comorbilidades) inerentes. As opções terapêuticas consistem no controlo sintomático, na prevenção de complicações, aumento da sobrevivência, atraso na progressão da doença e melhoria da qualidade de vida.

Nem todos os doentes necessitam de tratamento imediato. Este está indicado para doentes com sintomas relacionados com a SMD ou doentes de alto risco, em que a esperança de vida é curta sem tratamento, devido à elevada probabilidade de progressão para Leucemia Aguda.

A decisão terapêutica baseia-se na idade do doente, na sua performance status (condição física) e comorbilidades, e também nas características da doença, traduzidas pelos índices de prognóstico (IPSS e IPSS-R).

– Suporte

A terapêutica de suporte constitui uma parte importante do tratamento destes doentes, por se tratar de uma doença crónica e atingir sobretudo doentes idosos. Inclui as transfusões e o uso de antibióticos em contexto de infecção.

As transfusões de concentrados eritrocitários e plaquetas administram-se quando ocorrem sintomas relacionados com anemia ou trombocitopenia, respetivamente.

Os factores de crescimento, proteínas que estimulam a produção de células sanguíneas (eritropoietina recombinante, isoladamente, ou associada a G-CSF -estimulador das colónias de granulócitos), são frequentemente utilizados nas anemias sintomáticas com o objectivo de evitar as transfusões e melhorar a qualidade de vida.

A quelação do ferro promove a remoção do ferro em excesso no organismo, que se deposita e acumula nos vários órgãos (por exemplo coração, fígado, pâncreas e tiróide), levando à sua insuficiência. A sobrecarga de ferro é provocada pela própria doença, mas também pelas múltiplas transfusões de concentrados eritrocitários realizadas no decurso da doença. Os quelantes do ferro podem ser administrados por via oral ou injectável, apresentam poucos efeitos secundários, e têm impacto na qualidade de vida e sobrevivência.

– Terapêutica de SMD de baixo risco

O objetivo do tratamento neste grupo de doentes é melhorar a qualidade de vida do doente, tentando minimizar as consequências das citopenias. Para esse efeito utilizam-se os estimuladores da eritropoiese (eritropoietina com ou sem G-CSF) e as transfusões.

A lenalidomida é um imunomodelador utilizado num dos subtipos das SMD, denominado Síndrome 5q, com redução das necessidades transfusionais.

– Terapêutica de SMD de alto risco

Os doentes com SMD de alto risco apresentam uma menor sobrevivência e uma maior probabilidade de progressão para Leucemia Aguda. Por este motivo, a terapêutica visa alterar a história natural da doença, atrasando a sua evolução.

Neste grupo, estão indicados os hipometilantes, azacitidina ou decitabina, que não obrigam a internamento e deverão ser administrados até toxicidade ou progressão da doença.

O transplante alogénico de progenitores hematopoiéticos e a quimioterapia agressiva estão geralmente reservados a um grupo restrito de doentes com SMD (doentes jovens ou sem comorbilidades que impeçam o procedimento).

A estimativa da sobrevivência nestes doentes é baseada nos índices de prognóstico, na idade do doente e na presença de comorbilidades associadas. No entanto, existe uma grande variabilidade, sobretudo nos doentes pertencentes ao grupo de baixo risco.

A qualidade de vida do doente depende sobretudo da gravidade das citopenias e complicações inerentes às mesmas. Ou seja, se existe anemia grave, terá que ser efctuado um programa transfusional e de quelação adequado. Alguns doentes apresentam resposta aos estimuladores da eritropoiese com independência transfusional transitória.

De igual modo, na presença de trombocitopenia é importante realizar transfusões de plaquetas, sobretudo perante hemorragias ativas ou frequentes.

A leucopenia pode estar associada a infeções que devem ser tratadas adequadamente; se ocorrerem episódios de infeções recorrentes, poderá ser necessário uma terapêutica para a prevenção das mesmas.

 

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